A nível mundial, 60 mil mortes prematuras por ano estão associadas à poluição atmosférica causada por navios. Só na União Europeia, a poluição causada por navios causa cerca de 60 mil milhões de euros em custos de saúde por ano. As emissões de óxidos de enxofre (SOx), óxidos de azoto (NOx) e partículas finas (ultra) provenientes do transporte marítimo constituem uma ameaça significativa para a saúde humana, o ambiente e o clima. Na região do Mediterrâneo, as emissões dos navios contribuem substancialmente para os níveis de emissões ambientais de cerca de 250 milhões de residentes. A Organização Mundial da Saúde (OMS) adverte que os níveis médios anuais na região estão muitas vezes a exceder as suas diretrizes de qualidade do ar em mais de cinco vezes. Além disso, cerca de 70% das cidades dos estados litorais do Mediterrâneo estão muito acima das recomendações da OMS para níveis de poluição PM2,5 (partículas finas). As elevadas concentrações ambientais de PM2,5 devido às emissões dos navios correspondem exatamente às principais rotas marítimas e afetam diretamente as zonas costeiras, onde muitas das cidades mais densamente povoadas da região do Mediterrâneo estão localizadas.
Decisão de ontem de avançar com uma área de emissões controladas de enxofre no Mar Mediterrâneo é histórica mas ainda incompleta
Ontem, 10 de dezembro, é um dia para celebrar uma grande vitória para a saúde e para o ambiente devido a uma redução significativa das emissões de dióxido de enxofre dos navios que circulam no Mediterrâneo — mas, por outro lado, perde-se aqui uma grande oportunidade ao negligenciar os óxidos de azoto nocivos. Na reunião das partes contratantes da Convenção de Barcelona em Antália na Turquia esta semana, os Estados mediterrânicos acordaram em designar uma área de controlo de emissões de enxofre (MedECA). Os países litorais concordaram avançar para a última etapa para solicitar uma área de controlo das emissões de enxofre que abrange todo o mar Mediterrâneo na reunião da Organização Marítima Internacional (OMI) no início de 2022. Após o processo de tomada de decisão na OMI, a MedECA deverá entrar em vigor em janeiro de 2025.
De momento, a submissão à OMI não incluirá um regulamento relativo às emissões nocivas de azoto dos navios. No entanto, pelo menos, os países concordaram em trabalhar em matéria de emissões nocivas de óxidos de azoto (NOx) nos próximos dois anos, a fim de, espera-se, apresentar também uma área de emissões controladas em matéria de NOx.
As SECA (Sulphur Emission Control Areas – área de emissões controladas relativa ao óxidos de enxofre) e as NECA (Nitrogen Emission Control Areas – área de emissões controladas relativa ao óxidos de azoto) são áreas de emissões controladas previstas no Anexo VI da Convenção MARPOL da Organização Marítima Internacional. Nestas áreas, o combustível a ser utilizado não pode ter mais de 0,1% de enxofre, cinco vezes menos do que o atualmente permitido. No que respeita aos óxidos de azoto, os novos navios têm de utilizar tecnologias que permitam uma redução significativa destas emissões.
O grupo de organizações não-governamentais de ambiente que há anos fez campanha para uma MedECA (https://en.nabu.de/topics/traffic/eca/index.html) e que inclui a ZERO, congratula-se com a decisão dos Estados mediterrânicos. Trata-se de um enorme passo em frente no sentido de um ar mais limpo na região. A desvantagem é que ainda falta uma regulamentação eficaz para reduzir as emissões nocivas de óxidos de azoto provenientes dos navios. Tal é dececionante uma vez que os dados científicos exaustivos mostram que apenas uma área combinada de controlo das emissões de enxofre e azoto maximizará os benefícios para a saúde. Tal poderia evitar entre 3.100 a 4.100 mortes prematuras por ano em 2030 nos países Mediterrânicos. Ter apenas uma das duas medidas eficazes é como combater um fogo com apenas um balde de água em vez de usar a mangueira.
Os líderes dos países mediterrânicos têm agora de demonstrar mais ambição nas próximas etapas e devem chegar rapidamente a acordo sobre uma regulamentação em matéria de azoto para os navios do Mediterrâneo, a fim de proteger eficazmente a saúde das pessoas, o ambiente e o clima.
ZERO quer uma área de emissões reduzidas do Atlântico Nordeste / Portugal tem agora papel fundamental em linha com o previsto na Estratégia Nacional para o Mar 2021-2030
Para as áreas costeiras e cidades portuárias, os navios são uma importante fonte de poluição do ar. O tráfego marítimo na costa continental de Portugal, de acordo com uma estimativa aproximada da ZERO no período pré-pandemia, totaliza aproximadamente uma emissão de 3,5 mil toneladas de dióxido de enxofre por ano, representando um acréscimo de 8% às emissões deste poluente em Portugal Continental no ano de 2018, e 85 mil toneladas de óxidos de azoto, representando um acréscimo de 55% das emissões deste poluente em relação ao total do país. Os navios são assim uma fonte de poluição atmosférica muito significativa, influenciando a qualidade do ar das zonas litorais face à predominância de ventos de Oeste e Noroeste que encaminham a poluição do mar para as zonas terrestres, apesar de não haver ainda uma quantificação clara desta influência.
A Organização Marítima Internacional adotou um limiar de 0,5% de enxofre para o combustível utilizado pelos navios, regra que entrou em vigor em 2020. Mesmo com estes novos limites, áreas com elevado tráfego marítimo, como a Costa Atlântica de Portugal continental e o Mar Mediterrâneo, são particularmente afetadas por essas emissões prejudiciais do transporte marítimo, como partículas, carbono negro, óxidos de azoto e óxidos de enxofre.
Na Resolução de Conselho de Ministros nº 68/2021, de 4 de junho, que aprovou a Estratégia Nacional para o Mar 2021-2030, Portugal compromete-se a estudar a inclusão da sua Zona Económica Exclusiva (ZEE) junto à costa continental e insular, numa nova área de controlo de emissões de enxofre e azoto no Atlântico Nordeste, ligando as áreas já existentes no mar Báltico, mar do Norte e Canal da Mancha ao Mediterrâneo.A ZERO considera indispensável este passo e apela ao governo português para o dinamizar com a maior urgência. Tal implicará também uma articulação do governo com os países a Nordeste (Espanha, França Irlanda e Reino Unido). Note-se que o percurso entre o canal da Mancha e o Mar Mediterrâneo é a origem/destino maioritário do tráfego de atravessamento da zona costeira de Portugal Continental.
Info: Associação ZERO